A boa mãe é aquela que vai se tornando desnecessária com o passar do tempo.
Várias vezes ouvi de um amigo psicanalista essa frase e ela sempre me
soou estranha. Até agora. Agora que minha filha adolescente, aos quase
18 anos, começa a dar vôos-solo. Chegou a hora de reprimir de vez o
impulso natural materno de querer colocar a cria embaixo da asa,
protegida de todos os erros, tristezas e perigos. Uma batalha hercúlea,
confesso. Quando começo a esmorecer na luta para controlar a super-mãe
que todas temos dentro de nós, lembro logo da frase, hoje absolutamente
clara. Se eu fiz o meu trabalho direito, tenho que me tornar
desnecessária.
Antes que alguma mãe apressada venha me acusar de desamor, preciso
explicar o que significa isso. Ser 'desnecessária' é não deixar que o
amor incondicional de mãe, que sempre existirá, provoque vício e
dependência nos filhos, como uma droga, a ponto de eles não conseguirem
ser autônomos, confiantes e independentes.
Prontos para traçar seu rumo, fazer suas escolhas, superar suas
frustrações e cometer os próprios erros também. A cada fase da vida,
vamos cortando e refazendo o cordão umbilical. A cada nova fase, uma
nova perda é um novo ganho, para os dois lados, mãe e filho. Porque o
amor é um processo de libertação permanente e esse vínculo não pára de
se transformar ao longo da vida.Até o dia em que os filhos se tornam
adultos, constituem a própria família recomeçam o ciclo. O que eles
precisam é ter certeza de que estamos lá, firmes, na concordância ou na
divergência, no sucesso ou no fracasso, com o peito aberto para o
aconchego, o abraço apertado,o conforto nas horas difíceis.
Pai e mãe - solidários - criam filhos para serem livres. Esse é o maior
desafio e a principal missão. Ao aprendermos a ser 'desnecessários', nos
transformamos em porto seguro para quando eles decidirem atracar.
Márcia Neder Bacha é psicanalista e pesquisadora da UFMS e da USP/NUPPE.
Doutora em Psicologia Clínica e autora de Psicanálise e Educação –
Laços Refeitos e A arte de formar: o feminino, infantil e o
epistemológico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário